Análise com Spoilers | ‘The Last of Us’ S01E03:  “Long Long Time”

Depois de dois episódios em que a fidelidade tinha como uma ferramenta auxiliar para o encaminhamento da história, “Long Long Time” é o primeiro episódio da série “The Last of Us” a trazer algo de novo para narrativa, com sensibilidade em retratar dois personagens tão complexos numa relação tão singela, passando a mensagem de que até nos tempos mais sombrios o amor é resistência e prevalecerá.

Ao contrário dos dois episódios, o terceiro episódio não começa com um prólogo, e sim o telespectador continua a ver a jornada de Joel e Ellie após escaparem dos infectados no episódio anterior. Joel (Pedro Pascal) está perto de um rio empilhando pedras, ele visivelmente de luto pela morte de Tess (Anna Torv) tentando equilibrar alguma coisa em um mundo onde tudo está desequilibrado, o silêncio entre ele e Ellie (Bella Ramsey) escancara a inquietação após o sacrifício de Tess. Ellie diz orgulhosamente “não me culpe por algo que não é minha culpa”, conscientizando Joel que os essa relação vai lidar aqui pra frente.

No caminho até Bill e Frank, a série restaga os momentos de diálogo e interação como os personagens, com Ellie perguntando para Joel como ele conseguiu a sua cicatriz, enquanto o mesmo responde secamente. No caminho, eles encontram uma loja abandonada e entram buscando suprimentos e armas que Joel deixou secretamente. Ellie volta para seu lado infantil ao ver um arcade quebrado de Mortal Kombat.

Em um momento em que os dois se separam, Ellie vai para os fundos e ao encontrar um absorvente, ela se depara com um infectado preso em escombros e ela decide se aproximar da criatura por curiosidade. Podemos ver mais uma vez como está o nível de qualidade na maquiagem de próteses com o bolor e cogumelos brotando da cabeça da pessoa. Terminando a cena, Ellie mata pela primeira vez um infectado com sua faca e retorna omitindo esse fato ao Joel, essa cena é importante para vemos eles sozinhos agindo e reagindo ao que acontece ao seu redor, para enfim notamos que esses dois precisam um do outro para ter equilíbrio.

De volta a estrada, Joel explica para a Ellie que a teoria mais provável a origem do surto, seriam através dos alimentos feitos por farinhas e grãos contaminados pelo Cordyceps que eram exportadas ao redor do mundo, o que facilitou a contaminação, como os fãs suspeitavam no prólogo dos primeiros episódios, e se a pessoa comer o suficiente, pode infectar você. Com alimentos contaminados chegando às lojas em todo o mundo de uma só vez, não demoraria muito para que muitos fossem infectados e começassem a morder. Em apenas alguns dias, o mundo foi destruído. Enquanto eles continuam caminhando, Ellie encontra uma pilha de ossos humanos. Joel explica que uma semana após o surto, os soldados varreram o campo, evacuaram pequenas cidades e disseram às pessoas que estavam se mudando para as Zonas de Quarentena – se houvesse espaço. Se não houvesse, as pessoas que não estavam doentes eram mortas e deixadas para os infectados, e a câmera foca numa pedaço de roupa florida e um cobertor de arco-íris que pertencia a um bebê com sua mãe, levando a entender que eles foram mortos pelo exercito, mostrando como esse mundo acabou se tornando tão cruel.


Voltamos para 2003, em 30 de setembro, onde somos apresentados a Bill (Nick Offerman), um sobrevivencialista que se preparou a vida toda para um apocalipse e preparou uma série de armadilhas para os infectados em volta de sua fortaleza e viveu assim por quatro anos. Mesmo ele tendo recursos, plantando seus próprios vegetais e criando seus próprios animais, um lugar seguro e armado até os dentes, ele sente um vazio dentro de si, tendo apenas as câmeras de sua residência servindo como televisão, vendo os infectados sendo pegos nas suas armadilhas mortais, mais isso não é o bastante, sem saber, Bill estaria prestes a encontrar aquilo que precisava para preencher esse seu vazio e seria no fundo de uma vala. Esse seria Frank (Murray Bartlett) que estava na Zona de Quarentena de Baltimore e estava tentando chegar a Boston e que seu grupo começou com dez pessoas, mas só sobrou dele. Bill decide dar abrigo para ele, e é ai que o relacionamento dos dois começam a aflorar.

A interpretação de Nick Offerman é excelente, trazendo um lado mais terno que jamais seu personagem demonstrou haver no jogo, ele é convida a expressar uma gama variada de emoções durante o episódio, passando pelo sobrevivente que você teria medo ao cruzar com ele para um parceiro amoroso, e sua performance é acentuada com a atuação de Murray Bartlett, como Frank. Conseguindo desarmar Bill com sua aura calma, seu charme ajuda muito a tira-lo de sua atmosfera normalmente alerta, principalmente quando eles tocam “Long Long Time” no piano, esse momento em que os dois compartilham seu amor pela música é construído de uma maneira linda pois é ai que eles compartilham seu amor um pelo outro.

O ritmo ágil de Bill estabelecendo um perímetro para mundo exterior, é substituído por um ritmo mais lento,  quando vemos diante de nossos olhos uma vontade do casal de aproveitar essa vida aparentemente normal. Com o tempo, as desavenças do casal aparecem, pulamos para três anos depois, vemos os dois brigando depois que Frank pediu um pouco de tinta e um pouco de gasolina para o cortador de grama. Bill segue sendo cabeça dura, sempre alerta para os perigos do mundo exterior, enquanto Frank tem uma postura mais amigável, tanto que ele acaba conhecendo Tess pelo rádio e eles acabam conhecendo Tess e Joel e os dois formam uma parceria em um almoço em um momento completamente fora ao mundo pós-apocalíptico.

Em dois saltos temporais, vemos o vínculo do casal mais forte do que nunca sendo em momentos de risco como protegendo seu lar dos invasores humanos ou numa uma plantação de morangos que Frank fez de surpresa para Bill.


Chegamos nos dias atuais, onde vemos que os dois homens ficaram mais grisalhos, enquanto Frank desenvolve uma doença degenerativa e em uma cadeira de rodas e depende da ajuda de Bill o tempo todo, ele pinta retratos lindos quase todas sendo Bill ou a realidade que os rodeia, e por não conseguir mais sua doença torna difícil de concluir seus quatros que Frank pede pelo seu último dia antes que a situação piore. Frank diz que em seu último dia, ele quer que Bill faça um brinde para ele, então eles irão para a butique de seu bairro – que Frank consertou – onde ele escolherá roupas para os dois. Então, Bill preparará um jantar delicioso, esmagará todas as pílulas de Frank e as colocará em seu vinho. Frank então levará Bill para cima, onde Frank adormecerá nos braços de Bill. Segurando o choro, Bill diz que não pode fazer, mas Frank pergunta se ele o ama, ao que ele responde que sim, e Frank diz que ele deveria “me amar do jeito que eu quero que você ame“.

Em uma sequência devastadora, acompanhamos o último dia do casal, de um passeio pelo bairro, sentando no mesmo piano onde eles se apaixonaram pela primeira vez, até o jantar acompanhado do vinho cheio de remédios, mas Frank é surpreendido com a decisão de Bill de também colocar um fim em sua vida, pois sente que cumpriu seu papel ao passar o resto da sua vida ao lado da pessoa que mais amou, justificando: “Você foi o meu propósito”, então Frank pede a Bill levá-lo para a cama. Os dois recém-casados ​​vão para a cama, prontos para passar seus últimos momentos de vida juntos nos braços um do outro.

Esse desfecho pega todos os jogadores de surpresa ao ser diferente do jogo. No jogo, Joel e Ellie encontram “Bill’s Town” para encontrar seu residente morando sozinho. Frank é apenas mencionado, mas nunca visto, como o ex-parceiro de sobrevivência de Bill que se mudou para outro lugar após um grande desentendimento, e depois disso o jogador descobre o cadáver em decomposição de Frank, e uma carta deixada para trás revelando que ele foi infectado e consequentemente cometeu suicídio, levando consigo um ódio duradouro por Bill até o fim. Essa mudança escancara o valor de uma adaptação para uma outra mídia, onde os criadores Graig Mazin e Neil Druckmann poderem aprofundar em questões que foram deixadas de relance e alterações de narrativas costumeiras para diferenciar da obra original.


Voltamos a Joel e Ellie chegando na residência de Bill e Frank, e encontram a carta deixada por Bill destinada para a pessoa que encontrar a carta. Ellie lê a carta, que diz a quem o encontrar (que ele presume ser Joel) para não entrar no quarto. Bill escreve que eles podem pegar todos os suprimentos, armas e um carro preparado à disposição e afirma que nunca gostou de Joel, mas ainda é como se fossem quase amigos. Bill acrescenta que costumava odiar o mundo e ficaria feliz quando todos morressem, mas estava errado, pois havia uma pessoa que valia a pena salvar. Essa é mais uma frase arrebatadora em que nos ajuda a entender como um homem conseguiu achar um amor num momento onde ele se fechava cada vez e vendo nesse amor um propósito para sobreviver e protege-lo até o fim.

Como forma de se distanciar, Joel propõe três regras para Ellie: Não mencionar a Tess, não falar para ninguém sobre sua mordida e fazer tudo o que ele mandar. Com isso, Joel decide que eles irão atrás de Tommy (Gabriel Luna), que foi um ex-Vagalume, mas está tendo problemas no Wyoming, e talvez ele possa descobrir para onde levar Ellie. Com os dois saindo da fortaleza na caminhonete de Bill – a primeira vez que Ellie já esteve em um carro antes. Ellie encontra uma fita cassete de Linda Ronstadt e coloca para tocar, encerrando ao som de “Long Long Time”, que nomeia esse episódio. Enquanto eles se dirigem para Wyoming, vemos a janela do quarto de Bill e Frank aberta e entrando cada vez mais no quarto enquanto Joel e Ellie vão embora e a canção de Ronstadt dizendo que “vou amar você por muito e muito tempo“.

Long Long Time” nos apresenta uma história de amor contada de forma magistral em um mundo sem esperança, o terceiro episódio de “The Last of Us” é de partir o coração. Relativamente sem ação o episódio se concentra no amor e na tristeza que tanto o companheirismo quanto a solidão podem trazer nesse mundo. Nick Offerman e Murray Bartlett assumem os papéis deixando uma marca na história da série e na história das séries norte-americanas dos últimos anos, mostrando um lado da humanidade que vale a pena salvar.

The Last of Us é exibida aos domingos na HBO e na HBO Max às 23h.

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